quinta-feira, 3 de junho de 2010

Cobrança (Moacyr Scliar)

       Ela abriu a janela e ali estava ele, diante da casa, caminhando de um lado para outro. Carregava um cartaz, cujos dizeres atraíam a atenção dos passantes: "Aqui mora uma devedora inadimplente".
        ― Você não pode fazer isso comigo ― protestou ela.
      ― Claro que posso ― replicou ele. ― Você comprou, não pagou. Você é uma devedora inadimplente. E eu sou cobrador. Por diversas vezes tentei lhe cobrar, você não pagou.
        ― Não paguei porque não tenho dinheiro. Esta crise...
        ― Já sei ― ironizou ele. ― Você vai me dizer que por causa daquele ataque lá em Nova York seus negócios ficaram prejudicados. Problema seu, ouviu? Problema seu. Meu problema é lhe cobrar. E é o que estou fazendo.
        ― Mas você podia fazer isso de uma forma mais discreta...
       ― Negativo. Já usei todas as formas discretas que podia. Falei com você, expliquei, avisei. Nada. Você fazia de conta que nada tinha a ver com o assunto. Minha paciência foi se esgotando, até que não me restou outro recurso: vou ficar aqui, carregando este cartaz, até você saldar sua dívida.
        Neste momento começou a chuviscar.
        ― Você vai se molhar ― advertiu ela. ― Vai acabar focando doente.
        Ele riu, amargo:
        ― E daí? Se você está preocupada com minha saúde, pague o que deve.
        ― Posso lhe dar um guarda-chuva...
        ― Não quero. Tenho de carregar o cartaz, não um guarda-chuva.
        Ela agora estava irritada:
       ― Acabe com isso, Aristides, e venha para dentro. Afinal, você é meu marido, você mora aqui.
      ― Sou seu marido ― retrucou ele ― e você é minha mulher, mas eu sou cobrador profissional e você é devedora. Eu avisei: não compre essa geladeira, eu não ganho o suficiente para pagar as prestações. Mas não, você não me ouviu. E agora o pessoal lá da empresa de cobrança quer o dinheiro. O que quer você que eu faça? Que perca meu emprego? De jeito nenhum. Vou ficar aqui até você cumprir sua obrigação.
       Chovia mais forte, agora. Borrada, a inscrição tornara-se ilegível. A ele, isso pouco importava: continuava andando de um lado para outro, diante da casa, carregando o seu cartaz.
                                      O imaginário cotidiano. São Paulo: Global, 2001.    

6 comentários:

Daniella Caruso Gandra disse...

Oi, tbem sou professora de língua portuguesa, vou passar essa crônica Cobrança aos meus alunos e pedir para que analisem, através de perguntas. Ela é muito engraçada, e tem um tom irônico muito sutil. Gostei!
Se vc quiser acessar meu blog, o endereço é http://www.qbonecadoll.blogspot.com
Um abraço!

Unknown disse...

gostei muito do texto,achei muito legal.

Unknown disse...

Adorei,só que tem que colocar mais algumas coisinhas pra encrementar o texto pra dar um melhor apetite se é que podemos dizer isso.
Até mais.
Beijoss

nã sei disse...

sou aluna da escola joão proença.minha professora
leu esse testo pra gente
eu adorei...
bem criativo só uma pessoa com muita criatividade como(moacyr scliar)para fazer uma coisa assim tão impougante de ler achei muito interesante adorei.
ass:nayara

Alien disse...

Nossa .. Este texto é para minha escola, ainda bem que achei ele aqui !!! #Repassando

Unknown disse...

tipo eu gostei muito mais tem algumas palavras erradas e na minha opinião não deveria ter